terça-feira, 14 de setembro de 2010

EDUARDO ESCOREL OPINA SOBRE A RIOFILME

Faço a ressalva que houve por parte desses cineastas a convocação de uma reunião com o José Wilker, durante sua gestão, para cobrar e fazer propostas de linha de atuação para a empresa, porém nada pode ser realizado, até porque a Riofilme não se encaixava em nenhum programa do governo Cesar Maia, não tinha função específica, estava no limbo. No mais considero a análise que ele faz da trajetória da empresa, e também da Embrafilme, bastante pertinente. Transcrevo a seguir.

Retirada da revista Piauí
8/9/2010 - 14:14 Melancolia – cineastas reclamam SC Rio de Janeiro (RJ) 20/08/2010 Classe cinematográfica critica a Riofilme. Foto Mônica Imbuzeiro / Agência O globo

Não pude evitar sensação de melancolia diante da foto publicada no Segundo Caderno de “O Globo” em 25 de agosto. Alinhados, lá estão veteranas e veteranos cineastas – alguns, colegas e amigos com quem já trabalhei –, reunidos segundo a matéria para discutir a gestão de Sérgio Sá Leitão, atual diretor-presidente da RioFilme, distribuidora subordinada à Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro, criada em 1992. Olhando a foto, lamento ver o sorridente grupo fazendo esse papel.

Embora a palavra “reclamação” tenha sido evitada com cuidado, no fundo parece ser disso que se trata. Mais do que “questionamento” e “descontentamento” com a política de investimentos da RioFilme, a impressão resultante da leitura da matéria é que por trás da mobilização está o fato dos filmes do grupo não estarem recebendo recursos da distribuidora.

Afinal, embora nunca tenha passado de contrafração da Embrafilme (1969-1990), relações pacíficas com os profissionais da área prevaleceram ao longo dos últimos 18 anos, sem que sucessivas gestões da RioFilme tenham sido contestadas. Regra geral, predominaram interesses corporativos, vínculos pessoais e interferências políticas. Certo ou errado, a atual gestão definiu uma estratégia, o que tem direito e obrigação de fazer. Embora possa ser contestada, o uso do jornal para fazer pressão é tática antiquada que não dignifica os reclamantes.

Volto a olhar para a foto e tento lembrar de alguma iniciativa consistente por parte do grupo retratado para estabelecer procedimentos impessoais e uma gestão eficaz. Posso estar enganado, mas não lembro que isso tenha ocorrido. Há notícia de protestos isolados, inclusive uma tentativa de invasão por parte de jovens cineastas. Fora isso, nada. O que explica a omissão dos veteranos?

Por cerca de 20 anos, a complacência dos cineastas brasileiros com a contradição inata da Embrafilme foi, em grande medida, responsável por sua extinção – criminosa pela maneira como foi feita, mas que estava fadada a ocorrer mais cedo ou mais tarde. Empresa estatal com receita assegurada – qualquer que fossem os resultados das suas operações comerciais –, fazendo adiantamentos sobre receita a fundo perdido sem correção monetária em período de inflação alta, era fatal que um dia perdesse legitimidade social e condições políticas para subsistir.

Simulacro da Embrafilme, a RioFilme foi criada para assegurar meia dúzia de empregos e dar sobrevida a um modelo de produção notoriamente esgotado. Dirigida de início por produtores comprometidos com interesses corporativos, depois por um crítico, chegou a ser entregue a um diplomata e acabou nas mãos de um ator. Com altos e baixos, tem tido atuação errática – mais expressiva em alguns momentos, sempre seguidos, porém, de longos interregnos de estagnação.

Devendo ter ao menos atuação nacional, condição necessária para justificar uma distribuidora de filmes, o fato da RioFilme ser municipal é um impasse que a levou a se tornar dependente de distribuidoras privadas, com atuação mais abrangente. Sendo uma empresa, não pode, por definição, sustentar déficits operacionais indefinidamente. Coincidência ou não, ao se aproximar da idade com que a Embrafilme foi extinta, corre o risco de ter o mesmo fim inglório.

Curioso é que em outras cidades e estados, há apoio efetivo ao cinema por parte do poder público. Basta citar São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco e Rio Grande do Sul. E no Rio de Janeiro? A RioFilme não terá se tornado um impedimento? O que há aqui é omissão do governo estadual e tentativa inadequada do poder municipal, travestida de atuação empresarial. Para discutir esse modelo falido uma reunião de cineastas pode ser necessária. Para reclamar publicamente da RioFilme, a mobilização resulta melancólica.

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