domingo, 30 de janeiro de 2011

ARMAS: ESCOLAS, LIVROS E ARTES

Leio hoje no jornal a história de Alessandro Buso, criado na periferia de São Paulo, subempregado a vida toda, ex drogado e que hoje é dono de uma livraria e já publicou mais de dez livros. Os livros que falam a linguagem da gente simples e contam histórias de vida cujo publico alvo,como ele diz, é o vizinho. O que me chamou atenção na entrevista foram alguns detalhes mencionados por ele ao falar o que o levou para fora da vida medíocre que poderia lhe ser reservada, caso não caminhasse para a literatura. Trechos como:
_ “minha mãe arrumou emprego como empregada doméstica e quando vinha para casa trazia livros que achava nos sebos do Centro”
_ “Um dia chegou uma mulher do círculo do livro, ela distribuiu um catálogo... fiquei olhando sem interesse. Aí, vi um nome Cristiane F. 13 anos drogada e prostituída, eu doidão, me interessei... uma vida que era a minha.
_ “a primeira lembrança literária... uma professora, Clélia, leu uma redação minha em voz alta”

Curiosamente na contracapa deste mesmo caderno a carta de um leitor transcrita na coluna de Cora Rónai, corrobora o sentimento que me veio ao ler sobre o Alessandro
O leitor Luis Ernesto Meirelles também fala de uma infância, este aqui no subúrbio do Rio, em que viu colegas caírem no mundo do crime, desmistifica a idéia de bandidos que nascem ruins e destaca como fundamental para não estar hoje também á margem da sociedade, o fato de sua mãe (sempre elas) mesmo com muita dificuldade, não ter aberto mão de fazê-lo estudar e relata_
“Podíamos não ter nada, e às vezes não tínhamos sequer almoço direito, mas não nos faltavam os livros, os cadernos e alguns lápis... eram todas escolas municipais ou estaduais... Tobias Monteiro e Thomas Mann no Cachambi, José Veríssimo no Rocha, deixaram marcas indeléveis no cidadão que me tornei.”

Ainda refletindo sobre educação/cultura e arte e a importância destes fazeres para tirar do fundo do poço e dar cidadania a qualquer pessoa, me recordo do programa Profissão Repórter desta semana na TV, cujo tema era a violência dentro das escolas brasileiras, o sofrimento dos professores que são desrespeitados e desafiados, ameaçados de serem “entregues” ao pessoal do “movimento”. Alunos desinteressados, muitos abandonando a escola.
Uma professora de artes se destaca naquele cenário fazendo-se respeitar não apenas por sua postura firme, mas possivelmente (isso não é mostrado) por oferecer aos jovens adolescentes alguma coisa que lhes interesse, pois quando perguntados por que a tratavam diferente, respondem “porque faz a gente feliz.”

Nada disso é surpreendente, todos sabemos e os governos também que a família (muitas vezes representada pela mãe), a escola (professores e direção), os livros e o acesso a cultura de um modo geral, são poderosos remédios contra a mediocridade, a violência e o crime, especialmente quando gerados pela ignorância e pela pobreza. Neste momento em que o lado feio da nossa cidade mostra como foi fermentado ao longo dos anos e transborda aos nossos olhos, não cabe só tampar a panela, precisamos mudar a receita, usar outro fermento e temperar a criançada e os jovens que estão se formando por aí, com oportunidades de acesso a educação e a cultura de qualidade, que falem a mesma língua no sentido de atrair sua atenção, despertar-lhe o interesse, valorizando o que eles trazem. Cabe investir no profissional de educação para que encontre aquele jeitinho especial que aquela professora de artes encontrou, para que conheçam e saibam utilizar outras formas de passar conhecimento e uma delas e usar o cinema, a literatura, os jogos, o teatro e os livros de forma inteligente e atraente.
Estas matérias e o programa a que me refiro seriam, por exemplo, boas alavancas para reflexões e propostas de trabalhos em sala de aula.
Enfim, dizer isso é quase chover no molhado, mas a repetição é uma forma de luta.
(9 de dezembro de 2010)

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